Por Pedro Nunes
Dizer Sim ou Não é um ato político que exige compreensão da vida. Requer educação e consciência do bem-comum.
Amigo Simorion, vamos raciocinar. Nessa questão de festa paga pelos cofres públicos, o povo não tem a mínima condição de decidir pelo SIM ou pelo NÃO. O gestor municipal é que dispõe de dados financeiros relativos ao equilíbrio de suas contas e do erário municipal. Logo, só o prefeito é que pode decidir. Até admito um retorno aos padrões da democracia grega onde tudo era decidido pelo povo em praça pública. Mas, para isso, é preciso informar aos cidadãos o orçamento da festa. Por que a prefeitura não publica, item por item, cada um dos gastos que serão feitos? Aí, com base em dados reais, perguntaria ao povo: SIM ou NÃO. A enquete que está posta no Vitrine do Cariri é simplória demais. Pergunta, sem informar.
Mas tudo bem. Levantei apenas alguns questionamentos, temeroso de que a moda pegue nos demais municípios miseráveis do Cariri paraibano. Na verdade, esse não é um problema ou um dilema a ser enfrentado apenas pela Prefeita Edna Henrique. Todos os prefeitos de municípios da região vão ter que tomar essa decisão: faço ou não faço a dispendiosa festa de São João, pisando em cima de um montão de carcaças? Acho que não vale à pena fazer megaeventos numa situação em que todo o povo está precisando recuperar as imensas perdas sofridas. E perdas a gente só recupera com trabalho, produção, economia, gastando apenas e tão somente o estritamente essencial à vida. Jamais, investindo no supérfluo ou fazendo festas.
Veja, sou a favor do turismo. Mas, segundo os estudiosos desse ramo de atividade, megafesta não é turismo. A clientela é um povo que chega à noite e some de madrugada. Tenho certeza que em qualquer festa desse tipo em municípios do Cariri, sai mais dinheiro do que fica. Isso porque tudo vem de fora: comidas (que não há mais produção agrícola local), bebidas alcoólicas, refrigerantes, carne (que o gado morreu todo), água mineral (que as águas estão imprestáveis), roupas para as pessoas irem às ruas, bandas caras (que o povo não valoriza mais os sanfoneiros locais) e por aí vai. Se fosse possível somar tudo isso na ponta do lápis e comparar com o dinheiro que fica, eu tenho certeza que a festa empobrece mais que enriquece o município. Lembro-me das Missões do Santo Frade Frei Damião de Bozzano, que Deus o tenha no Céu. Era um megaevento religioso que atraía multidões. Quando o frade taumaturgo e sua comitiva iam embora, o lugarejo, antes em festa, ficava na miséria. O comércio penava sem ver circular um vintém.
É que o dinheiro tinha ido embora todinho, nas algibeiras do esperto Frei Fernando e de muita gente de fora que acorria ao povoado ou cidadezinha para vender sexo, jogos de azar, comidas, bebidas, cigarros e tudo o mais exigido por uma festa profana que se preza.
Não estou questionando o caso específico de Monteiro que fez uma enquete SIM ou NÃO, sem apresentar uma planilha de gastos para possibilitar ao povo tomar uma decisão equilibrada e coerente, se é que isso adiantaria. O povo quer mesmo é festa atrás da outra. Estou, SIM, questionando um povo que perdeu o gosto pelo trabalho e pela produção. Trata-se de uma população que hoje só pensa em pagode e mais pagode à custa dos cofres públicos.
Acho que as prefeituras do Cariri paraibano precisam lutar para descobrirem vocações econômicas para cada localidade. Turismo, talvez, até poderia ser uma delas. Mas, repito, megaevento não é turismo. Turismo é uma ação permanente que cria uma economia sustentável. Turistas não são aves de arribaçã que chegam e somem de repente. Estou errado? Imagino que não.
Estranho é o silêncio da camada social mais esclarecida da cidade de Monteiroe da região que se omite na hora de uma discussão que envolve interesses coletivos. Ficamos eu e o Mestre Simorion Matos, pessoa por quem nutro grande estima, discutindo o assunto, cada um em sua trincheira, como se a questão levantada não tivesse a menor importância para os municípios do Cariri paraibano que, se já eram pobres, ficaram mais pobres ainda depois dessa terrível seca.
Por que o povo, com a mesma energia que dança e pagoda na frente das bandas, não se mobiliza e pressiona o Governo Federal para fazer investimentos estruturadores na região? Por que o povo não vai às ruas protestar contra a paralisação das obras da Transposição e contra os imensos desperdícios e desvios de dinheiro que aconteceram durante os poucos trechos construídos? Nada disso acontece porque o povo dessa região perdeu a capacidade de lutar pelos interesses coletivos e só pensa em festas. Perdoem a franqueza, mas o povo está sendo educado para viver de pagode em pagode, e não, para trabalhar como acontece em países como o Japão, a Coreia, a Alemanha e muitos outros que afundaram em guerras e soergueram suas economias, investindo em educação, qualificação de mão de obra, trabalho e produção.
Será que as carcaças que jogaram, dias atrás, na porta do BNB em Campina Grande não sinalizam grandes perdas para a economia regional? Prejuízos são recuperados com trabalho e contenção de despesas supérfluas, tanto por parte dos governantes, quanto por cada cidadão vítima de algum incidente negativo, pessoal ou coletivo. Educar para a vida é alfabetizar e instruir, mas é também criar consciência de cidadania e amor ao trabalho.
Todos sabem que hoje em dia as fazendas estão parando a produção porque ninguém quer mais trabalhar. A nova onde é comprar motos e viver para cima e para baixo, gastando o dinheiro que recebem das esmolas enganosas que o Governo Federal disponibiliza e por conta disso cria uma deformação imensa na educação do povo, desviando-o do trabalho.
Pergunto: a região do Cariri tem futuro com um povo e homens públicos possuidores desse tipo de mentalidade? Cadê os Blogs Eletrônicos formadores de opinião, que silenciam e não estimulam a criticidade do povo? Cadê os educadores, responsáveis maiores por uma revolução das mentes juvenis? Cadê os profissionais liberais, médicos, advogados, engenheiros? Cadê os magistrados, promotores públicos e procuradores que atuam na região? Cadê os poetas, os escritores, os religiosos, que também se omitem e silenciam? Cadê esse povo todo?
Cadê?...
Pedro Nunes Filho
*É Auditor Aposentado da Receita Federal do Brasil, advogado e sócio do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico de Pernambuco - IAHGP. Tem diversos livros publicados sobre a região do Cariri paraibano.
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